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Sala de Imprensa

09/11/2018

Um prêmio para prevenir a violência

 O professor Joseph Murray, do Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia da UFPel, recebeu o prêmio Investigator Award, da agência Wellcome Trust, para financiar pesquisas inéditas sobre as causas e os fatores de prevenção da violência e do comportamento agressivo, com base em resultados das Coortes de Nascimentos de Pelotas.

O financiamento, no valor de 2,8 milhões de dólares será aplicado em três frentes de estudos sobre o tema até 2024 - determinantes da violência na primeira infância, análise do aumento da violência em nível populacional e prevenção precoce da violência. 

O pesquisador irá conduzir a primeira pesquisa populacional a investigar a influência de uma série de fatores biológicos e psicossociais presentes durante a infância sobre o desenvolvimento de padrões de agressividade e violência ao longo da vida, no contexto de países de baixa e média renda. 

“Um problema central na criminologia é entender por que uma pequena proporção de crianças, entre 5 e 10%, desenvolve problemas de conduta persistentes que têm início precoce, ainda na infância, e acarretam alto risco para crimes graves e violentos. Como esse pequeno grupo, em geral, depois responde por mais da metade dos crimes, a identificação desses fatores de risco precoces é fundamental para a prevenção”, afirma o pesquisador. 

Pela primeira vez, o estresse, medido pelo biomarcador cortisol, será avaliado entre os fatores de risco para a violência em uma coorte de nascimentos e grande porte. O estudo irá examinar como a exposição de mães e crianças ao estresse crônico pode afetar indiretamente a trajetória de agressividade infantil. A hipótese é de que o estresse prolongado na infância esteja relacionado a prejuízos do funcionamento cognitivo e social, com impacto sobre o desenvolvimento da agressividade.  As principais áreas do cérebro relacionadas ao autocontrole e à regulação emocional são vulneráveis a consequências adversas da ativação excessiva do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal em resposta ao estresse. 

Problemas de autocontrole infantil, como hiperatividade e impulsividade, são frequentemente associados a comportamentos antissociais. Déficits de habilidades verbais também desempenham um papel fundamental em condutas persistentes de agressividade. Dificuldades com  a linguagem afetam o preparo para ingressar nas atividades escolares e a capacidade de transitar pelas interações sociais. 

“O nosso estudo será o primeiro a analisar a relação entre o estresse crônico, indicado pelos níveis de cortisol em amostras de cabelo de mães e crianças, e padrões de agressividade. Especificamente, vamos determinar se ambientes estressantes afetam o comportamento agressivo via prejuízos da função sociocognitiva infantil”, completa o professor. 

Já entre as mães, a exposição ao estresse crônico pode afetar os cuidados oferecidos à criança, com  danos à regulação emocional infantil. Os pesquisadores irão verificar a associação entre estresse crônico materno e práticas parentais ligadas ao desenvolvimento da agressividade em crianças. 

Análise da trajetória da violência em Pelotas

Durante o período de realização dos estudos das Coortes de Nascimentos de Pelotas, entre 1982 e 2015, a taxa de homicídios aumentou aproximadamente cinco vezes em Pelotas, passando de cerca de cinco homicídios por cem mil habitantes, em 1982, para quase 25 por cem mil, em 2015.

Outro braço do estudo contemplado com o financiamento da agência britânica prevê documentar as mudanças socioeconômicas, em Pelotas, com base em dados do  censo demográfico (repetido a cada 10 anos), das coortes de nascimento de Pelotas, de registros oficiais e indicadores políticos e socioeconômicos nacionais. A partir dessa base de dados, o grupo de pesquisadores poderá determinar o impacto de determinantes sociais sobre a escalada da violência na cidade, entre eles: desigualdades sociais, migração rural-urbana, expansão de grandes áreas de favelas, e epidemia de crack. 

Duas hipóteses serão testadas especificamente dentro das coortes de Pelotas: o aumento dos fatores de risco na primeira infância e a propriedade contagiosa da violência. 

“Vamos olhar para essas questões de uma nova perspectiva, usando a teoria da ‘estratégia de história de vida’ como estrutura de análise. Essa teoria propõe que a raiz da propensão para comportamentos de risco, incluindo a violência, está na percepção de ambientes de ameaça à sobrevivência a longo prazo. A falta de perspectivas para o futuro pode levar a disposições psicológicas de autocontrole precário, atitudes de risco e comportamentos violentos”, comenta Murray. 

Resultados de estudos anteriores apontam uma relação incomum entre a vitimização e a infração: tornar-se vítima de um delito pode levar a mais violência ao ativar uma resposta defensiva e gerar futuros comportamentos violentos de retaliação e autoproteção, configurando uma possível relação recursiva entre vitimização e violência. Segundo Murray, a violência apresenta um efeito contagioso que poderia explicar em parte o aumento exponencial  em Pelotas. 

Intervenções para prevenir a violência

 Uma das frentes do estudo já está em andamento para avaliar a eficácia de dois programas de treinamento para prevenir a violência na primeira infância: o estudo PIÁ (Primeira Infância Acolhida) irá acompanhar e verificar os resultados de duas intervenções, o ACT - Criando Crianças Seguras - e o Conte Comigo, ambos conduzidos em parceria com a Prefeitura de Pelotas na rede municipal de ensino. 

O ACT é um programa de orientação a mães sobre habilidades e práticas para criar os filhos com afeto e segurança ao longo de 8 semanas. O programa ajuda as mães a compreender as emoções negativas dos filhos e responder a estas emoções usando formas positivas de educar. 

O Conte Comigo é um programa que ensina pais e mães a compartilhar livros com os filhos, estimulando a inteligência das crianças. A técnica é ensinada em encontros de grupo, para promover um vínculo entre pais e filhos, melhorar as habilidades de linguagem e atenção e escuta das crianças e ajudar a preparar o ingresso infantil na escola. 

“De acordo com os resultados, podemos contribuir para formulação de  programas de saúde baseados em evidências para prevenir a violência desde a primeira infância. O objetivo é proporcionar cidades mais seguras e relações familiares mais propícias ao desenvolvimento do pleno potencial de cada cidadão”, conclui o pesquisador.




Fonte: Assessoria de Imprensa





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Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia - Centro de Pesquisas Epidemiológicas