O Brasil é o segundo maior produtor e o líder mundial em exportações de fumo. A região sul representa quase a totalidade da produção nacional de tabaco e apenas o estado do Rio Grande do Sul é responsável por 50% desta produção. O trabalho na fumicultura é artesanal e baseado na agricultura familiar, envolvendo cerca de 200 mil famílias. O ciclo de produção prolonga-se durante o ano inteiro e apresenta, nas diferentes etapas da produção, exposição a diversas cargas de trabalho, em especial as fisiológicas. As exposições no trabalho resultam, frequentemente, em problemas ergonômicos como a dor lombar aguda e/ou crônica e as limitações/incapacidades decorrentesA dor lombar aguda acomete a maioria dos indivíduos em algum momento da vida e é definida como uma dor a partir da 12ª costela que se estende até a linha glútea inferior. Cerca de 5 a 10% dos casos persistem por mais de três meses, caracterizando a dor lombar crônica, a qual resulta em elevados custos trabalhistas e previdenciários por afastamentos do trabalho, além de intenso sofrimento aos indivíduos acometidos. Embora a fumicultura na região sul do Brasil empregue centenas de milhares de famílias de agricultores familiares e das cargas de trabalho desta atividade oferecerem riscos para o surgimento de dor lombar e de limitação para o trabalho, não foram encontrados estudos que avaliem estes desfechos entre fumicultores. Objetivos Redigir três artigos científicos, o primeiro para avaliar a prevalência e os fatores associados à limitação para o trabalho por dor lombar entre os fumicultores; o segundo para avaliar a prevalência e os fatores associados à dor lombar crônica (DLC) em fumicultores; e o terceiro, realizar uma revisão sistemática para avaliar a informação existente na literatura sobre a prevalência de DLC em estudos de base populacional. Métodos para os dois primeiros artigos foram utilizadas as informações provenientes de um estudo de delineamento transversal com uma amostra de 2469 fumicultores com dezoito anos ou mais de idade do município de São Lourenço do Sul, RS. A dor lombar foi estabelecida através de uma adaptação do Questionário Nórdico para sintomas musculoesqueléticos. A limitação no trabalho por dor lombar foi estabelecida através da seguinte pergunta feita aos indivíduos que relataram dor lombar: “No último ano você teve que deixar de fazer atividades no trabalho por causa dessa dor na região lombar?”. Para o artigo de revisão sistemática, foram buscados a partir de critérios rigorosos de seleção, estudos que avaliassem a prevalência de dor lombar crônica. Resultados Do total de 2469 indivíduos entrevistados, 8,4% relataram DLC, 36,0% relataram dor lombar no último mês (DLM) e 30,8% apresentaram dor lombar aguda. 6,2% dos indivíduos tiveram limitação no trabalho por dor lombar, sendo que entre os indivíduos com DLC esta prevalência foi de 37,6%, enquanto que entre os indivíduos com DLM e DLAguda, a prevalência de limitação foi de 14,4% e 7,8%, respectivamente. As tarefas que os indivíduos mais deixaram de fazer em todos os tipos de dor lombar foram: transportar as folhas, fazer o transplante, empilhar lenha e colher o baixeiro. A idade foi diretamente associada à limitação por DLM, sendo maior o risco para os indivíduos mais velhos (RP 3,34; IC95% 1,73-6,44), enquanto o gasto com IPVA foi inversamente associado. Estar com dificuldade para pagar dívidas (RP 1,55; IC95% 1,06- 2,25) e teste positivo para distúrbios psiquiátricos menores (RP 1,95; IC95% 1,40-2,72) também foram fatores associados à limitação no trabalho por DLM. Entre os fatores associados à DLC, criar duas ou mais espécies de animais (RP 1.65; IC95% 1.14-2.38) e ter maior idade foram fatores de risco para DLC. Fazer muita força (RP 2.00; IC 95%1.43- 2.79), trabalhar em posturas forçadas (RP 1.36; IC 95%1.02-1.82), doença da folha verde (RP 1.63; IC 95%1.18-2.25), intoxicação por agrotóxicos (RP 2.37; IC 95% 1.70-3.32) e distúrbios psiquiátricos menores (RP 2.55; IC 95% 1.88-3.47) também foram associados à DLC.De acordo com os resultados da revisão sistemática de literatura, foram selecionados 28 estudos de base populacional, sendo que em 13 a dor crônica foi definida como dor contínua igual ou superior a 3 meses. Entre os estudos com taxas de resposta acima de 75%, a idade foi a característica que exerceu maior influência sobre a prevalência de DLC, que variou entre 4,2% em estudos com indivíduos com idade de 24- 39 anos a 19,6% naqueles com indivíduos entre 20-59. De oito estudos com indivíduos com idade ≥18/20/21 anos, em seis a prevalência de DLC variou entre 3,9% a 10,2%. Conclusões A dor lombar crônica apresentou elevada prevalência e resultou em limitação para o trabalho, em específico nas tarefas que impõem maior sobrecarga à coluna lombar. São necessários estudos que aprofundem o conhecimento sobre a dor lombar em trabalhadores agrícolas, considerando os seus efeitos agudos e crônicos. Da mesma forma, se faz necessária a padronização dos estudos sobre DLC, em específico sobre a sua localização anatômica e cronicidade. Alternativas, tais como a mecanização da colheita, devem ser discutidas entre trabalhadores, entidades representativas e pesquisadores de forma a melhorar proteger a saúde dos fumicultores. Da mesma forma, profissionais de saúde que atendem trabalhadores da agricultura em geral devem conhecer os fatores de risco e as limitações decorrentes da dor lombar, em específico da DLC neste grupo ocupacional de forma a atuar preventivamente, bem como evitando a cronificação da dor lombar aguda. Além disso, as discussões acerca da diversificação de culturas e do significado de um trabalho agrícola extenuante voltado para a produção de um produto que é fator de risco para inúmeras doenças, devem levar em conta a vulnerabilidade destes trabalhadores, bem como propiciar uma efetiva melhoria das condições do trabalho na agricultura.